segunda-feira, 31 de outubro de 2016

“Morrer em paz com os homens, e de mal consigo mesmo”

 Edilson Martins

“Morrer em paz com os homens, e de mal consigo mesmo”

by edilsonrmartins
Camus - 1957 - dançando.jpg
Já temos um novo prefeito. Aqui e em outras cidades brasileiras.
Com perspectivas de ficar 8, ou mais anos. Portanto, mais um futuro cacique.
Logo mais teremos um novo Ano.
Nesse ano que se anuncia não há espaço para esperanças, tem sido aqui repetido, à exaustão, pelo menos na cidade do Rio.
E, no entanto, há desafios pessoais, sempre mais importantes que os de natureza pública.
Deletar o cigarro, perder peso, beber menos, mudar de emprego, resgatar o desejo na companheira, ou largar o casamento que depreciou, repensar a vida.
Novo Ano é pleno de esperanças.
Todos sabem; a esperança é a vitamina dos que perderam, dos que acreditam em milagre, em reza forte, dos que ainda esperam acontecer.
Podemos até perder a fé - que nunca tive - a esperança nunca. A vida sem esperança é a morte antecipada.
Nenhum apostador de Loteria esportiva tem déficit de esperança, por óbvio.
O mito de Sísifo, que Camus se apropria para realizar uma obra magistral, é uma construção que nos ajuda, talvez, a compreender melhor a existência humana.
Condenado a repetir, sempre, a tarefa de empurrar uma pedra até o topo de uma montanha, quando o consegue ela despenca e retorna novamente ladeira abaixo.
Uma força irresistível invalida completamente o duro esforço empreendido.
Mais uma metáfora da vida humana?
E, no entanto, o Novo Ano é a busca de mudanças, renovação dos sonhos.
Ou estamos todos condenados a reproduzir o esforço insano, sem sucesso, de Sísifo, onde os sonhos, os desejos, os desafios perseguidos terminam descendo ladeira abaixo?
Camus, que sobreviveu, literariamente, o que parece não ter acontecido a Sartre, registra que parcela maior da existência é construída a partir da esperança, esperança de um amanhã sempre melhor.
E, no entanto, essa esperança do amanhã, é justamente ela que nos aproxima da morte.
Mas registremos que, antes disso, não raro, acontece o doloroso naufrágio das quimeras, dos projetos, dos mais cultivados de nossos sonhos.
Nem Camus, nem Sartre, assim falaram. Machado certamente. 
Se a vida é um grande palco, onde há os que se apresentam bem, e não poucos serão sempre canastrões, convenhamos que raramente somos o que parecemos, tão pouco parecemos o que de fato somos.
Tudo isso para resgatar a tragédia de mestre Romão, personagem eterno de Machado.
George Gershwin, que nos deu joias como Rhapsody in Blue, entre outras, teria morrido infeliz por não ter sido alçado à condição de um clássico.
Mestre Romão sempre sonhou  criar uma grande missa, com a estatura de um Mozart, de um Bach. Não teve êxito.
Morreu celebrado pelas modinhas carnavalescas ou peças de campanhas políticas que ele criava. Peças engajadas, de encomenda. O povão adorava.
Ele, internamente, se odiava.
edilsonrmartins | 31 de outubro de 2016 às 12:55 PM | Tags: Camus - Sartre - Sentido da vida - Ano Novo | Categorias: Sem categoria | URL: http://wp.me/p5iPRc-6HF

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